Papa Francisco visita a Sinagoga de Roma
"Caros irmãos e
irmãs,
Sinto-me feliz por
estar aqui, entre vós, nesta Sinagoga. Agradeço pelas palavras cordiais do Dr.
Di Segni, a senhora Durighello e o Dr. Gattegna. Agradeço a todos vós pela
calorosa recepção. Tada rabbá! Obrigado!
Na minha primeira visita a esta Sinagoga, como
Bispo de Roma, desejo expressa-lhes, como também a todas as Comunidades
judaicas, a saudação fraterna de paz desta e de toda a Igreja católica.
As nossas relações me interessam muito. Em
Buenos Aires, eu já estava acostumado a frequentar as sinagogas para encontrar
as comunidades lá reunidas; seguir de perto as festividades e comemorações
judaicas; dar graças ao Senhor, que nos dá a vida e nos acompanha no caminho da
história.
Ao longo do tempo, criou-se uma união
espiritual que favoreceu o nascimento de autênticas relações de amizade, que
inspirou um empenho comum. No diálogo inter-religioso é fundamental
encontrar-nos, como irmãos e irmãs, diante do nosso Criador e a Ele prestar
louvor; respeitar-nos e apreciar-nos mutuamente e colaborar.
No diálogo judeu-cristão há uma ligação única
e peculiar em virtude das raízes judaicas do cristianismo: judeus e cristãos
devem, portanto, sentir-se irmãos, unidos pelo próprio Deus e por um rico
patrimônio espiritual comum (cf. Declaração Nostra aetate, 4) no qual
basear-nos e continuar a construir o futuro.
Ao visitar esta Sinagoga, prossigo nas sendas
dos meus Predecessores. O Papa João Paulo II esteve aqui há trinta anos, em 13
de abril de 198; Papa Bento XVI esteve entre vós há seis anos atrás, agora
estou eu aqui.
Na sua primeira visita, João Paulo II cunhou a
bela expressão “irmãos mais velhos”! De fato, vocês são os nossos irmãos e as
nossas irmãs mais velhos na fé. Todos nós pertencemos a uma única família, a
família de Deus; juntos, Ele nos acompanha e nos protege como seu Povo; juntos,
como judeus e como católicos, somos chamados a assumir as nossas
responsabilidades por esta cidade, dando a nossa contribuição, também
espiritual, e favorecendo a resolução dos diversos problemas atuais.
Espero que aumentem, sempre mais, a
proximidade espiritual, o conhecimento e
a estima recíprocos entre as nossas duas comunidades de fé. Por isso, é
significativa a minha vinda entre no vosso seio, precisamente hoje, 17 de
janeiro, o dia em que a Conferência Episcopal italiana celebra o “Dia do
diálogo entre Católicos e Judeus”.
Comemoramos, há pouco, o 50° aniversário da
Declaração Nostra Aetate do Concílio Vaticano II, que tornou possível o diálogo
sistemático entre a Igreja católica e o Judaísmo.
No passado dia 28 de outubro, na Praça São
Pedro, pude saudar também um grande número de representantes judaicos, aos
quais dirigi as seguintes palavras: “A verdadeira e própria transformação da
relação entre Cristãos e Judeus, durante estes 50 anos, merece uma gratidão
especial a Deus. A indiferença e a oposição se converteram em colaboração e em
benevolência. De inimigos e estranhos, tornamo-nos amigos e irmãos”.
O Concílio, com a Declaração Nostra Aetate,
traçou o caminho: “sim” à descoberta das raízes judaicas do cristianismo; “não”
a toda forma de antissemitismo e condenação de toda injúria, discriminação e
perseguição, que disso derivam”.
Nostra Aetate definiu, teologicamente, pela
primeira vez e de maneira explícita, as relações da Igreja católica com o
Judaísmo. Ela, naturalmente, não resolveu todas as questões teológicas que nos
dizem respeito, mas fez uma referência encorajador, fornecendo um estímulo importantíssimo
para ulteriores e necessárias reflexões.
A propósito, em 10 de
dezembro de 2015, a Comissão para as Relações religiosas com o Judaísmo
publicou um novo documento que aborda as questões teológicas, emergidas nos
últimos decênios, após a Declaração Nostra Aetate (n. 4).
Com efeito, a dimensão teológica do diálogo
judaico-católico merece ser sempre mais aprofundada. Por isso, encorajo todos
aqueles que estão comprometidos com este diálogo a continuar neste caminho, com
discernimento e perseverança.
Do ponto de vista teológico, aparece sempre
claramente a indivisível ligação que une Cristãos e Judeus. Para se
compreenderem, os cristãos não podem não fazer referência às raízes judaicas;
a própria Igreja, professando a
salvação, mediante a fé em Cristo, reconhece a irrevocabilidade da Antiga
Aliança e o amor constante e fiél de Deus por Israel.
Por mais importante que sejam as questões
teológicas, não devemos perder de vista as situações difíceis, com as quais o
mundo de hoje se defronta. Os conflitos, as guerras, as violências e as
injustiças causam ferimentos profundos na humanidade e nos impelem a
comprometer-nos pela paz e pela justiça. A violência do homem contra o homem
está em absoluta contradição com qualquer religião, digna deste nome e, em
particular, com as três grandes Religiões monoteístas.
A vida é sagrada, como dom de Deus. O quinto
mandamento do Decálogo, diz: “Não matar” (Ex 20,13). Deus, que é Deus da vida,
quer sempre promovê-la e salvaguardá-la. E nós, criados à sua imagem e
semelhança, devemos fazer o mesmo. Todo o ser humano, como criatura de Deus, é
irmão, independentemente da sua origem ou da sua pertença religiosa.
Toda pessoa deve ser vista com benevolência,
como faz Deus, que estende a sua mão misericordiosa a todos, independentemente
da sua fé e da sua proveniência; Ele dispensa atenção particular aos que mais
precisam dele: os pobres, os enfermos, os marginalizados, os indefesos.
Lá, onde a vida corre perigo, somos chamados,
por isso, a promovê-la e a salvaguardá-la. Quanto mais nos sentirmos ameaçados,
tanto mais deveríamos confiar em Deus, que é a nossa defesa e o nosso refúgio
(cf. Sal 3,4; 32,7), procurando fazer resplandecer em nós o seu rosto de paz e
de esperança, sem jamais ceder ao ódio e à vingança. A violência e a morte
jamais terão a última palavra diante de Deus, que é Deus do amor e da vida!
Devemos invocá-Lo com insistência, para que
nos ajude a praticar - na Europa, na Terra Santa, no Oriente Médio, na África e
em qualquer outra parte do mundo, - não a lógica da guerra, da violência, da
morte, mas a da paz, da reconciliação, do perdão, da vida.
O povo judaico, na sua história, teve que
padecer violências e perseguições, até ao extermínio dos judeus europeus,
durante o periodo da Shoah. Seis milhões de pessoas, apenas por pertencerem ao
povo judaico, foram vítimas da barbárie mais desumana perpetrada em nome de uma
ideologia, que queria substituir Deus com o homem. Em 16 de outubro de 1943,
mais de mil homens, mulheres e crianças da comunidade judaica de Roma, foram
deportados para Auschwitz.
Hoje, quero recordar-lhes de modo
particular: os seus sofrimentos, as suas
angústias, as suas lágrimas nunca devem
ser esquecidas. O passado deve servir de lição par o presente e o futuro. A
Shoah ensina-nos que é preciso sempre máxima vigilância, para poder intervir,
tempestivamente, em defesa da dignidade humana e da paz. Queria expressar a
minha solidariedade a cada testemunha da Shoah que ainda vive; saúdo, de modo
particular, aqueles que hoje estão presentes aqui.
Queridos irmãos mais velhos, devemos realmente
ser gratos por tudo o que foi possível realizar nos últimos cinquenta anos,
porque aumentaram e aprofundaram a compreensão recíproca e a mútua confiança e
amizade.
Peçamos juntos ao
Senhor, a fim de que conduza o nosso caminho rumo a um futuro bom e melhor.
Deus tem para nós projetos de salvação, como diz o profeta Jeremias: “Conheço
os meus projetos sobre vós – oráculo do Senhor -: são projetos de felicidade e
não de sofrimento, para dar-lhes um futuro e uma esperança” (Jer 29,11).
Que o Senhor nos abençoe e nos guarde. Faça
resplandecer sobre nós a sua face e nos dê a sua graça. Que o Senhor dirija o
seu olhar para nós e nos dê a paz (Num 6,24-26).
Shalom alechem!"